Ser feminista ocidental e propor-se a viver um ano numa cidade Indiana, é obra e requer nervos de aço. Este Domingo, véspera de feriado do Dia da República, fui a casa da minha chefe, para um jantar, no qual ela juntou vários elementos da sua família. Éramos cerca de 15 pessoas e as dinâmicas indianas em muito se assemelharam às que se pode observar em qualquer casa portuguesa: mulheres na cozinha, homens na sala. O único senhor nos domínios femininos, esteve lá apenas os minutos necessários para preparar a sua especialidade. Depois retirou-se para a zona mais masculina da casa e só voltou a aparecer para perguntar se a janta ainda demorava muito. Mas o que me fez ir para o quarto, fechar os olhos e respirar fundo várias vezes foi o que aconteceu depois da comida estar pronta: os homens comeram primeiro, na sala. Enquanto o mulherio observava da porta da cozinha e da janela do quarto. Mantinham-se por perto, para chegar o que fosse faltando aos comensais: um prato extra, um copo de água, mais comida. Quando os senhores terminaram, as mulheres reuniram-se na cozinha e comeram… os restos! Para esta discriminação de género, não interessa sequer a idade: o rapazinho de 5 anos come na sala com os homens.
Acho que foi a retenção de comentários durante a noite toda, que me fez chegar às 22h com uma dor de cabeça gigante. Quando é que as mulheres se vão aperceber que estes comportamentos não são aceitáveis e que para altera-los basta que elas batam com o pé no chão? Porque não estou a falar de um ambiente muito controlador: a minha chefe é presidente de uma organização de dimensão estatal, farta de receber prémios, vai semanalmente a reuniões com representantes da UNICEF e de outras organizações de renome internacional que reconhecem o trabalho dela. No entanto, quando eu lhe digo que ponha o marido a lavar a louça, ela diz: “Neveeer!” E depois venham-me com discursos que o status da mulher já está muito melhor só porque "já nos deixam ir às urnas". E não leantem a sobrancelha a dizer “A Índia é assim…”, porque desse lado do mundo as coisas ainda rolam da mesma maneira. O problema é que estes comportamentos estão tão inculcados que ninguém os vê como ofensivos, havendo até quem os ache românticos (porque não há-de a Maria mudar de nome depois de casada?!?).
Fica aqui o desabafo, que tenho que limitar ao blog porque ainda me faltam muitos meses por cá e não quero ser deportada antes do tempo.
terça-feira, 27 de janeiro de 2009
Dinner Party
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6 comentários:
ah, que carago, como eu concordo contigo! que é isso do homem ter prioridades?!
Nem quero crer! Os restos! E ainda não me tinhas dito nada.
Indianos... não se recomendam...
BEIJINHOsss
Bolas... há realmente ainda muita coisa para evoluir neste nosso mundo!
Um beijinhos muito grande!
Goi!!
Se a tua experiência acontecesse comigo, tenho a certeza absoluta que tinha mau humor, pelo menos, para 15 dias.
Para ti, para mim, e quero acreditar que para a maioria da nossa geração, alimentar primeiro o macho e a fêmea aguardar pelo que sobra é inadmissível... mas acredito que as distâncias culturais entre Portugal e Índia não são assim tão acentuadas.
Aqui vão exemplos...
Há uma festa aqui no Norte, creio que na Póvoa de Lanhoso, logo após a Páscoa, que se chama qualquer coisa como "almoço dos bifes". Nesse digno almoço, os machos alinham-se em mesas e bancos corridos, entopem-se de bifes uns atrás dos outros, e, curiosamente, o repasto é servido por mulheres. E aqui tudo é em exclusivo: sentar e comer é exclusivo do macho; servir e sair logo da sala para os machos ficarem à vontade é exclusivo da fêmea. A "tradição" é difundida e, na minha opinião, potenciada todos os anos graças às reportagens televisivas, que mostram este triste exemplo de subserviência feminina como algo giro, com piada... é uma tradição, carago! Quando se argumenta o protelar de algo pela tradição penso logo: Ainda bem que o canibalismo não é tradição por estas bandas.
Outro exemplo curioso ocorre em muitas casas. Eu já ouvi comentários como: "Dê-me aí um bifinho bom para o meu marido" (senhora a dirigir-se para o funcionário do talho) ou "Tenho que alimentar bem o meu homem porque é ele que leva o dinheiro para casa".
Se eu fosse a comentar isto como queria, nem amanhã acabava de escrever isto, mas aqui vai a minha ideia em forma de síntese:
Quantas mulheres portuguesas servem primeiro os maridos e só depois a elas próprias (boa educação à parte!)? Aliás, quantas mulheres servem sempre primeiro o marido (again, boa educação à parte!)
Quantas mulheres compram o bifinho para o marido e elas comem fêvera?
Quantas mulheres cozinham durante horas para reuniões de família e, por limitações de espaço, servem primeiro os homens e esperam que haja lugares livres para comerem no fim?
Quantas mulheres casadas acham natural serem elas a cozinhar?
Acredito que se trata de uma questão cultural e somente isso... e as mudanças de mentalidades e comportamentos precisam de gerações... e gerações...
BEIJOS!!!
PS: Obrigada mãe e pai pelos bons exemplos que contrariam os anteriormente descritos:)
Calma, calma ! de facto foi uma dinner party "muito machista", compreendo perfeitamente as tuas dores de cabeça. Mas é verdade, ainda vão ter que passar muitos e muitos e muitos.... anos para que esta desigualdade se altere.Até lá temos mas é que bater bem com os pés no chão.
Beijinhos
Pois...o verdadeiro progresso não se mede pela tecnologia mas pela mudança de mentalidades. Mas esta mudança não se inventa, vai-se criando, muitas vezes com dores de cabeça, num processo lento e nem sempre eficaz.
Com calma...por muito que custe!
Bjs
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