sexta-feira, 27 de março de 2009

Fui

Para os meus (gloriosos) 10 dias de férias. Até lá ficam com as imagens de parte da minha sexta-feira à tarde, em casa das minhas vizinhas do 2º andar.





quinta-feira, 26 de março de 2009

Contrabando alimentar

A Super Mãe chegou hoje com a mala carregadinha de presentes gastronómicos: presunto (fatiado, não se preocupem que não veio com a coxa do porco na mala), alheiras, atum e sardinhas enlatadas... Tudo preciosidades dificílimas de encontrar neste estado indiano, hiper vegetariano, onde a ingestão de ovos já quebra com a lógica "pure veg" cá do sítio. Quando comi a minha primeira fatia de presunto em 4 meses, confesso que fiquei tão feliz que lhe dediquei uma pequena dança. A aventura gastronómica vai continuar nos próximos dias, quando abalarmos em direcção a Goa onde (graças à influência portuguesa, gosto eu de pensar) não há restrições destas e carne, peixe e álcool fluem a bom ritmo. Entretanto, em jeito de pré-despedida, deixo-vos 2 curiosidades gastronómicas deste estado, onde impera a lei seca, sendo preciso uma autorização da polícia para comprar àlcool:
- quase toda a comida leva açúcar;
- a frase "no spicy" é impossível de ser percebida
(-it is not spicy.
- but my mouth is burning...
- no Teresa, it is not spicy.)

quarta-feira, 25 de março de 2009

Pormenores III

O Kaka (que é como quem diz, tio) a vender milho cozido à entrada de um jardim. Delicioso, o milho...

A tola da minha viziha Nidi.

A minha vizinha da frente, a criança mais tímida do prédio (foto by Nidi).

terça-feira, 24 de março de 2009

Ócio de perna cruzada

Os últimos dois dias têm sido de uma tranquilidade aborrecedora. Já terminei tudo o que tinha programado e como vou de férias a partir de amanhã (YUPI!) não posso começar com nenhum projecto novo. A presidente está fora e o escritório fica sempre transformado quando ela não está. Acho que o ditado “patrão fora, dia santo na loja” tem equivalente em Gujarati. Anda toda a gente mais relaxada (ainda mais, sim): lê-se o jornal a meio do dia e na secretária, fazem-se mais pausas para beber chai. Enfim, pasta-se, em homenagem às sagradas vacas. E eu aproveito para surfar (na net, claro que ainda nem vi mar desde que cá cheguei) e vou-me apaixonando pelo twitter...

P.S. A Super Mãe chega amanhã!

domingo, 22 de março de 2009

Demasiado

As vezes é demais. Demasiada informação para assimilar num contexto demasiado diferente. Na nossa última conversa tinha ficado a promessa de mais confissões. Eu tinha manifestado a minha curiosidade em saber como é o relacionamento dos namorados na Índia. E ela, despojada dos amigos que o namorado não a deixa ter e dona de uma personalidade alegre e comunicativa, tinha manifestado a sua vontade em partilhar tudo comigo. Assim, quando nos encontramos sozinhas num restaurante de beira de estrada no sábado à noite, começamos a conversa. Falou-me do primeiro namorado que teve e de como só trocaram um beijo depois de 1 ou 2 anos de namoro. Do homem que andou atrás dela depois desta primeira experiência e de como ele se afastou quando ela finalmente lhe devolveu alguma atenção. E depois conheceu o actual namorado. Há uns dois anos atrás. O problema das religiões irreconciliáveis foi logo abordado no início, quando ele lhe confessou que gostava dela, mas que nunca se casariam. Depois, com a voz mais baixa e pausando com mais frequência, a D. confessa o que imagino que há muito tempo quereria ter partilhado com alguém: que fizeram sexo. Explicou-me que ela não queria, como tinha recusado e como ele tinha insistido informando que não era nada de especial e que demorava muito pouco tempo. Aqui confesso que o meu queixo quase que bateu na mesa. “Desculpa, não percebi. Se tu não querias, como é que isso aconteceu?” O problema é que imaginamos as violações e os violadores como pessoas facilmente identificáveis, como os maus da fita num filme, em que logo no início a música nos deixa com uma firme suspeita que aquele homem não é boa gente. Nunca pensamos que um rapaz de sorriso gentil, prestável, competente, com quem trabalhamos diáriamente, se possa comportar como o vilão. Mas a vida real ultrapassa a ficção. “Ele forçou-te?”, “Sim, claro”.


Quando há uns anos estava a ler a biografia do Nelson Mandela, houve uma parte que me impressionou bastante. É um episódio em que ele descreve que, já depois de se ter formado em Direito e de ter começado a estagiar, algo aconteceu que o fez aperceber-se de que ele era uma pessoa de tanto valor como qualquer branco. Fiquei sensibilizada porque sempre pensei que os grandes transformadores da história, tinham sempre a noção da injustiça de que eram alvos. Nunca imaginei que a discriminação pudesse estar de tal modo infiltrada nos modos de vida, ao ponto de os fazer crer que eram efectivamente inferiores e que tinham menos valor como pessoa. Esta conversa com a D. faz-me relembrar esse momento. Enquanto lhe explico que o aconteceu tem enquadramento criminal e que a esse comportamento corresponde uma pena de prisão. Até na Índia. Ela parece surpreendida. Explica-me que para ela, em relação ao amor, sempre foi uma questão de, se ele está feliz, eu estou feliz. “E estás mesmo?” A resposta vem na forma de silêncio.

sábado, 21 de março de 2009

Leitura de fim de semana

The Untold Story of the World's Biggest Diamond Heist
Uma notícia que se lê como um romance ou o guião de um filme. Parece que a vida é mesmo melhor que a ficção. Como estou na Cidade dos Diamantes (60% dos diamantes do mundo são polidos aqui, ou pelo menos eram, antes da crise) pareceu-me relevante pô-la em fila. A dica veio daqui. Boa Primavera!

À espera...

- que a outra voluntária chegue (13 Abril)
- de partir para a Tailândia (8 Abril)
- de ir para Goa (de amanhã a 8)
- que a minha mãe chegue (Quinta-feira)
- que seja domingo (Amanhã)
- das seis da tarde ( dentro de 2h45)

segunda-feira, 16 de março de 2009

Pormaiores

Há uns dias atrás andava eu com o ego a sair-me pelas orelhinhas. Tudo porque um relatório que eu escrevi (sobre desenvolvimento estratégico de um projecto de HIV, ou seja, completamente fora da minha área de angariação de fundos) e que foi apresentado a uma agência governamental pela ong onde trabalho, recebeu tantos elogios, que os senhores funcionários públicos me convidaram a fazer parte do grupo de trabalho que vai desenvolver as guidelines do projecto.

Ontem chegou a convocatória oficial para a reunião de 3 dias (chegou de véspera, mas enfim, já me vou habituando aos prazos daqui) e para minha surpresa (e confesso que algum alívio) o meu nome não constava da lista dos participantes. Pergunto aos meus colegas o porquê desta mudança, ao que me respondem que o Big Boss não gosta de mim. Tendo em conta que eu nunca o conheci pessoalmente, fiquei intrigada. Então, mas porque é que ele não gosta de mim? "Because you are a smart girl." foi a resposta.

domingo, 15 de março de 2009

Domingo de manhã

"Podes esperar aqui 5 minutos enquanto eu vou lá em cima."
Estávamos à entrada de um prédio numa zona pobre da cidade. Tinhamos passado pela rua com o cheiro mais vil que encontrei durante esta minha estadia e estávamos agora rodeadas de prédios com grades em vez de janelas, sem portões de entrada e com pintura feita de manchas de detritos que nem quero adivinhar de onde vieram. A minha insistência em entrar não foi só movida pela curiosidade de ver como seriam os apartamentos. Não me apetecia nada ficar sozinha à entrada, alvo parado dos olhares curiosos a que ainda não me habituei completamente.

Lá dentro, o prédio é tão mau como anunciado. O lixo amontoa-se nas escadas. Nos pátios interiores, há cabras a comer mais lixo. Não imagino quantas pessoas devem viver naquele bairro, mas serão muitas. Cada andar tem uma estrutura em epinha: um corredor central com aberturas para os pátios que lhe dão alguma luz; braços para a esquerda e para a direita onde vivem os habitantes do bairro. A estes corredores, nem o sol das onze da manhã que brilha lá fora, consegue trazer luz. Seguimos por um. Como em todos os prédios indianos, as portas de todas as casas estão abertas. As pessoas estão cá fora. Mas aqui, os pertences dos habitantes também descansam no corredor: armários, cobertores, cadeiras e sacos plásticos. Quando finalmente entramos no apartamento da tia da minha colega, percebo o porquê do armazenamento em público. O espaço é exíguo, uma sala apenas sem mais divisões. A cozinha é um balcão num canto. Aqui vive um casal, com os seus dois filhos e a avó. Mais uma prova (desnecessária) que o conceito de privacidade não pode existir. Como sempre a hospitalidade é irrepreensível e sincera. Os curiosos juntam-se à porta. Tenho direito a sentar-me na unica cadeira de plástico que existe. Fazem-me perguntas e conversamos um pouco. Eu procuro tristeza nos olhos das pessoas, mas não consigo encontrar. Também não vejo felicidade. Talvez o reflexo da resignação. Ainda não sei. E enquanto tenho estes devaneios filosóficos, com o gujarati das conversas familiares como música de fundo, inclino a cabeça para trás para dar um gole na bebida que me ofereceram. Vejo um rato a correr pelo beiral da parede, junto ao tecto.

Sinto algum alívio quando voltamos para o exterior.

Momento Uau!

Ontem, na manhã musical que encerrou a semana de comemorações do Dia Internacional da Mulher, fui homenageada. Tive direito a troféuzinho, subida ao palco, mini discurso (até recebi palmas quando disse três palavras em gujarati)...

quinta-feira, 12 de março de 2009

Happy Holi parte II

Nos longínquos tempos dos deuses e deusas pintados de azul, era uma vez um rapaz que gostava mesmo muito de rezar a Ram.
O pai dele, rei assomado pelo complexo de deus (afinal não são só os médicos...), achava que a criança não devia rezar a mais nenhuma divindade, mas apenas venerar a existência do seu progenitor.
Solução encontrada para a obsessão do rapaz com a divindade: colocá-lo no meio de uma fogueira, da qual o poderoso Ram o salvou incólume. Esta é uma das lendas que se celebra na véspera do Holi. Como é que a água e as cores encaixam aqui no meio... admito a minha derrota mas não consegui descobrir (as minhas tentativas de ligar a água ao apagar do fogo pelo deus, foram motivo de chacota). Ficam aqui as provas fotográficas do que foi, até à data, o dia mais molhado e mais divertido da minha estadia neste lado do mundo.


terça-feira, 10 de março de 2009

Happy Holi!

Neste país há muita coisa difícil de explicar. O feriado de amanhã é uma dessas coisas. Eu sei que vindo de uma portuense, que todo o santo 23 de Junho vai prá rua martelar na cabeça de estranhos, pode parecer pouco razoável o comentário. Mas os meus colega indianos levam a loucura das celebrações religiosas um degrau mais acima dos martelos de S. João. E começam as comemorações na véspera. Há uns largos minutos atrás, um dos meus colegas foi "comprar cores", como eles aqui dizem. Chegou ao escritório com uma bocado de jornal, no qual vinha embrulhado um pó cor de rosa choque. Começa toda a gente, a tentar pintar a cara do colega. Como os exemplos têm que vir de cima, a presidente da ONG lidera os ataques! Rapidamente, o objectivo de pintar caras é alargado a cabelos, pescoços, roupa... Para melhorar a festa, aparece uma bisnaga. Claro que eu não podia deixar passar esta oportunidade em branco (ou a seco). Dois minutos depois, tenho a minha própria arma de esguicho, comprada por 20 rupias, ao fundo das escadas do escritório. Foi um massacre!

Depois do banho, as coisas acalmaram. Agora estamos à espera de uns colegas. Foram fazer uma fiel visit e devem estar a chegar. A minha bisnaga esta carregada e já vi uns 3 embrulhos de jornal em cima da secretária do lado. Happy Holi!

terça-feira, 3 de março de 2009

Slumdog Crorepati ou O Milionário da Favela

Depois ter recebido muitos mails a pedir a reacção in loco dos indianos ao super oscarizado Slumdog Milionaire, aqui está toda a verdade sobre o filme, as reacções e a apatia, desde Surat.

Num país com a dimensão da Índia, as reacções a um filme são tão variadas como seria a reacção de polacos e portugueses ao último trabalho do Joaquim Leitão. Sei que nas grandes cidades e particularmente em Bombaim, os ânimos foram bastante exaltados com o SM e toda a atenção mediática que recebeu. No entanto, numa "pequena" cidade, quase da província, como Surat, nenhum dos seus 4 milhões de habitantes foi gritar para a rua quando os vencedores dos oscares foram anunciados em Los Angeles.

Há uns dias atrás fui com três colegas de trabalho ver o filme. Uma sessão a meio da semana, perto das 20h00. A sala estava bem composta, tendo em conta que era um auditório do tamanho das salas grandes da Lusomudo. Para minha surpresa, antes do filme começar, mal terminam os anúncios, toda a gente se levanta das cadeiras. Começa então no grande ecrã, um vídeo clip do hino nacional indiano, com um grupo de cantores acima dos 50, de cabelos ao vento e testa franzida, a cantar emocionado Bharat, oh Bharat, que é como quem diz "Índia, ó India". Terminada a demonstração de fervoroso nacionalismo, sentam-se os espectadores, apagam-se as luzes e começa a película. Devo confessar que gostei bastante, apesar de estar a ver a versão hindi do filme. Mas como tinha lido o livro antes, consegui seguir bem a história (aconselho vivamente a leitura do livro que em inglês se chama Q&A e é de Vikas Swarup, um autor do Gujarat. Esse sim, é um verdadeiro soco no estômago, mais forte ainda que as imagens das favelas do filme).

Quando saímos do cinema, e porque não notei nenhum burburinho fora do normal por parte dos outros espectadores, perguntei aos meus colegas o que tinham eles achado do filme e que celeumas tinha ele causado. A primeira coisa de que se lembraram foi da reacção adversa do verdadeiro apresentador do Quem Quer Ser Milionário indiano. O senhor não gostou do modo como foi retratado no filme, particularmente das tentativas de manipulação do concorrente.

Nos jornais, as reacções dividem-se no que toca à exibição da pobreza. Algumas pessoas acham que mostrar as favelas indianas num filme, equivale a lavar a roupa suja em público. A vergonha nacional deve ficar dentro de fronteiras e ser lidada pelos indianos (estratégias para resolver o problema, ninguém as apresenta, nem tão pouco expressam revolta contra a passividade do governo face à situação). Para o autor de uma das opiniões que li, a arte tem como principal objectivo "elevar a alma" e isso não se consegue com imagens chocantes de crianças cobertas de fezes e a dormir em barracos. Do outro lado da linha, estão opiniões como as dos meus colegas. É verdade que ver a pobreza extrema exibida num ecrã tão grande e a ter projecção internacional não é motivo de orgulho. Mas o filme retrata uma realidade que existe e contra a qual nada está a ser feito É apenas uma fotografia da Índia real. A vergonha deve estar no facto das favelas existirem e não na divulgação internacional do problema.

Os jornais ainda vão trazendo algumas pérolas da famosa mentalidade indiana, que não sei se ache fascinante ou exasperante. Soube que as crianças que participaram no filme vão ter direito a uma casa cada uma (nada se menciona relativamente a educação, trabalhos para as família ou um plano mais holístico para resolver o problema dos milhões de pessoas que vivem abaixo do limiar da pobreza neste país). Notícia de primeira página do Times of India de ontem: um dos miúdos levou uma sonora bofetada do pai porque se recusou a falar com a imprensa. O miúdo estava cansado e por isso recusou uma entrevista, mas depois da eloquente argumentação do progenitor, veio a público dizer que percebia a reacção do pai e que ele (criança) estava era a ser preguiçoso. Contra actos não há argumentos.

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