Estou de volta, em estado de histeria quase completa visto só faltarem 30 dias para abandonar esta cidade poeirenta. Sei que ainda me vou arrenpender de tanto maldizer, mas neste momento as saudades de ambientes mais familiares falam mais alto que a Índia.
A conferência em Orchha foi fenomenal. É uma grande motivação e alento encontrar outros voluntários, trocar ideias, lamentos, histórias de horror, risos e, felizmente, muita cerveja. O hotel era de sonho, construido pelo neto do último Marajá ali da zona, que ainda carrega o título do avô. Conhecemos o senhor: nada de turbantes, nem de chinelos pontiagudos, apenas um homem normal, com um sorriso pacífico, uma barriga protuberante e uma cultura geral fora do que é habitual encontrar por aqui. O hotel, para além de pessoal super simpático, tinha uma pequena piscina mesmo à saida do meu quarto, o que me permitiu passar longas horas de molho. Numa das noites em que tivemos uma
pool party, estive 5 horas dentro de água. Depois de quase 30 anos a viver com o mar sempre perto do horizonte, o corpo sente falta de se emergir.
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A cidade era deliciosa. Muito pequena, mas com uns templos e um forte que atraem bastantes turistas, o que permite que se estabeleçam algumas lojas com artigos mais tradicionais, que não se encontram em Surat.
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Uma dessas lojas é propriedade de um senhor do Gujarate, Bahadurbhai, com quem troquei umas palavras na sua língua natal. Resultado: tive direito a ver as fotos da família e a ir almoçar a casa dele no dia seguinte, uma refeição deliciosa, preparada pela sua sempre sorridente esposa. No final do almoço, já eu lhe chamava Bapuji e ele oficializava a minha adopção com um "agora tens que voltar cá, porque tens família em Orchha".
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No dia seguinte fomos visitar o forte. Os fortes das cidades indianas são dos locais mais encantadores que já visitei. Já em Portugal gosto muito de ir aos castelos, porque tenho a impressão de entrar literalmente noutra época, em que elfos, duendes e cavaleiros andantes eram reais. Aqui a sensação é semelhante, mas o cenário é mais exótico. As pedras não são do granito cinzento, coberto de musgo português, mas são claras como areia e imponentes.
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O forte de Orchha tem imensos recantos, escadarias, varandas, pátios... enfim, espaços onde nos podemos perder durante horas, com a mente a viajar por fantasias de outros tempos. A sensação é ainda mais intensa se se tiver a sorte, como eu tive, de visitar o espaço numa altura em que este estava quase deserto de outros turistas.
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Este forte tinha a peculiaridade de ter um anexo chamado Camel House. A explicação à entrada do edifício deserto era bastante curiosa, já que os historiadores se dividem quanto aos usos que a casa pode ter tido e que vão desde uma pouco original estrebaria de camelos (se bem que o nome pode ter vindo do desenho das portas, que parece o contorno de um camelo gigante) até um Pavilhão do Prazer. Fica à imaginação de cada um.
Com o pavilhão do prazer a meus pés (sim, estou no telhado da Camel House, acessível através de umas escadas de meio metro de altura cada degrau).O regresso "a casa" foi feito num desconfortável comboio onde estive sentada/deitada durante 22 horas, com olhares perscrutadores, crianças a chorar e a música no mp3 quase sempre a tocar, na tentativa de abafar os ruídos da India do dia a dia, menos encantadora que as fantasias que deixei para trás.
Todas as fotos neste post são da autoria de Louise Creber / All photos in this post by Louise Creber.